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quinta-feira, novembro 21, 2024
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UM CIDADÃO COMUM

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Coluna de Antônio Neto

Debaixo da sombra do oiti, encosta o fusca. Agora, lavado e encerado. Dar duas aceleradas para ouvir o ronco do potente motor. Desliga, dar uma olhada na “tela”, que está amassada de tempo, pelo retrovisor interno, onde tem amarrado um cachorrinho de pelúcia, que sua esposa botou. Passa a mão no bigode e dar uma penteada nos cabelos grisalhos, com pente de dedo. Põe o pente no bolso da bermuda branca, junto ao espelho oval, que traz a foto de uma bela mulher, loira e seminua. Fecha os vidros, desliga o toca-fitas, tira a flanela do porta luvas, limpa as mãos e o bigode.

Foto: reprodução/internet

 Desce, dá uma ajeitada no cinturão da bermuda, e dá duas batidas, com a sola da sapatilha, no cimento da praça. Torce o pé para um lado, pro outro. Escarra e cospe no esgoto. Olha pro lado, pro outro. Assunta o tempo. Bota a mão na testa, faz uma careta, e dá uma fitada no sol. Verifica o relógio de pulso, segurando com a mão, para fixar o mostrador. Põe os óculos, esportes, sobre a cabeça e parte pro boteco, em sua camisa de tecido viscose, onde encontra a turma do balcão. Uns em pé, ao lado do balcão, com copo de cachaça e o cigarro na outra, duas cajás e uma pitada de sal. Outros sentados no peitoril, encostados nas colunas de madeira, nos tamboretes espalhados e a galera do carteado. Entra, cumprimenta os correligionários com tapinhas às costas.

(Foto: reprodução/Internet)

Vai ao balcão, pede uma dose de Magueira e, em seguida, uma cerveja. Senta num banco de pernas longas e bambas, onde ninguém quer sentar, por isso, fica, sempre, encostado na parede. Em quanto seu pedido está sendo providenciado, saca uma carteira de Hollywood, lacrada, tira o selo com a elegância de um fumante inveterado. Rasga o papel laminado, dar duas ou três batidas, tira um com a ponta da unha, e oferta aos viciados. Devolve a carteira ao bolso e, com o cigarro entre os dedos, continua conversando. Toma a dose, e morde a cajá, melada de sal. Pega o isqueiro, no bolso de lambança, dar duas batidinhas com o cigarro no balcão e toma um copo de cerveja. Leva o cigarro à boca e põe a mão, para evitar o vento. Dar uma tragada profunda e demorada, e solta a fumaça olhando para as telhas.

Chega em casa, às 17:30h, o que já é de praxe aos domingos. Bota o carro na garagem com dificuldade, o cachorro vem lamber seus pés e pular em suas pernas, quase provocando um acidente. Tira a camisa e põe no encosto da cadeira, da mesa da sala. Tira as sapatilhas, a esposa já sai do quarto com as sandálias e a toalha no ombro. “Tá sapecado de tanta cachaça!” Banha um banho demorado… Ela esquenta a comida, põe prato, talheres, pimenta, o copo de alumínio e uma garrafa d’água gelada. Volta ao quarto, arma sua rede, sol a sol, bota o lençol macio e liga a televisão… logo ele dorme.



Antônio Ribeiro de Sampaio Neto, nascido no bairro Cidade Nova, em Teresina(PI), no dia 29 de junho de 1963. Filho de Singleustre Ribeiro de Sampaio e de Marlene Lemos de Sampaio. Ex-funcionário do Banco do Brasil onde ficou por 15(quinze) anos. Cursou Letras Português com Literatura Brasileira e Introdução à Literatura Portuguesa, na Ufpi (Universidade Federal do Piauí). Pai de Ananda Sampaio (Escritora), Raíssa Sampaio, João Victor Sampaio e Bento Sampaio. Atualmente, reside na cidade, ribeirinha, de União(PI). Tem por hobby música(fã incondicional de Belchior – in memorian), livros e cachaça, ao pé do balcão. Adora passar o tempo jogando conversa fora(cotidianas, bobas e triviais à companhia de mentirosos – pescadores e caçadores).

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