A pescaria tecnológica de piaba
às 15:20

O Wilsin havia pedido uma espécie de gaiola pela Internet, para pegar piaba na barragem. Uma espécie de “garrafa” sofisticada, exótica e sedutora. Realmente, ela aberta parece uma aranha, o seu mecanismo é igual ao de um guarda-chuva. Em cima, no topo, ela traz um cordão onde, puxando, se arma e se desarma a mesma. É feita de plástico resistente e de linha especial. Pelo menos na aparência é linda mas não sabemos o seu grau de funcionalidade e de eficiência. Custou, ao mesmo, a bagatela de cento e setenta reais. Sempre pescamos com garrafa pet, de Coca-Cola, de guaraná Antártica, de Fanta Uva ou de Fanta Laranja. As iscas que sempre usamos são o xerém de milho ou o petisco, que as crianças adoram. As piabas, mundanas e viciadas, adoram o petisco, pois adoram ser crianças. É atração total e fatal. Com as garrafas pegávamos tanta piaba que era preciso parar de pescar para não estragar. Se bem que as piabas que saltam do balde ao chão, não sobra uma, pois os gatinhos crias do bar já ficam à espreita. Chegou a encomenda pelos Correios numa quinta-feira. Combinamos de inaugurá-la no sábado cedo. Ficamos na expectativa durante toda sexta-feira. Olhamos o manual, para não fazer nada errado e causar algum defeito ou dano, antes de testarmos a aranha mecânica. O Wilsin tem problema de insônia em dias normais, quanto mais quando está ansioso. Acordei às 5h, fui ao banheiro, voltei ao quarto, peguei o celular e fui pro quintal, pois sabia que já deveria ter várias mensagens dele dizendo para eu acordar. Dito e feito. Retornei para dizer que ia me organizar. O ritual de sempre… Saímos, rumo à barragem, às 7:10. Ela é maior do que pensávamos e tem seis entradas. Pelo menos charme ela tem de sobra. É elegante, esbelta, simpática e seduz. Esperei o sol subir mais um pouco para tomar a primeira piriguete. Empolgados estávamos. Armamos a bichinha e botamos sobre à mesa. O Cego, filho do seu Luiz, que gosta e vive de pescaria, e seu Luiz, proprietário do bar, por sinal, gente muito boa, se aproximaram da bichinha e ficaram estudando aquela marmota, de perna aberta, toda arreganhada sobre à mesa. Bem, depois de toda exposição e explicação, feitas pelo proprietário Wilsin, fomos testá-la. Armamos, botamos primeiro xerém como isca. Entregamos ao Cego e ele foi botá-la, segundo ele, que entende de pescaria, criou os dentes pescando, num lugar estratégico. Agora já dá para tomar uma. Resolvemos, ao invés da piriguete, tomarmos mesmo a cerveja de 600ml, a tradicional. O Wilsin tem preferência pela Skol, a caipira ou pé-duro, sem ser a puro malte, e eu, pela mais gelada. Marcamos o tempo e ficamos na expectativa, mas como ficamos tomando uma gelada, fomos relaxando. A primeira colheita, quase nada. Continuamos no xerém. Conversas alegres de alegria, piadas sem piabas, gargalhadas, um pouco de mentiras saudáveis para diversão do ambiente, pois fazem parte do cenário etílico. Segunda colheita, quase nada. Só uns “gatos” pingados. Fomos de petisco e resolvemos mudar de lugar. Voltamos ao repertório das músicas, das cervejas geladas, das mentiras e fomos esquecendo a pescaria. Terceira, quarto, quinta e, só, nada. As piabas pediam e imploravam pelas garrafas pet. Esquecemos de vez as piabas e a, mórbida, decepção com o artefato. Bebemos, brincamos, mentimos e desfrutamos do sábado dar melhor forma possível. Mesmo sem piabas, porém, com piadas. No final das contas, veio-me a inspiração: “Wilsin, vamos chamar a galera e vamos pôr a ‘arranha’ sobre à mesa, para tirarmos fotos e retratos, para postarmos nas redes sociais, pelo menos, assim, algum amigo nosso irá sentir uma vontade imensa, louca de estar aqui conosco”. Sem piabas, mas com piadas, mentiras gostosas e suaves e saudáveis, cerveja canela de pedreiro, e, enfim, bêbados, porém, felizes.