Coluna de Antônio Neto
Acordei com uma penca de cachorros vira-latas atrás de uma cadelinha malhada, molhada e magra. Banhei no ventinho gelado do amanhecer, que vara minhas costelas de frio. Lá no fundo do quintal, o cantar dos tizius, das garrinchas, o ganido e o latido dos cães, que ficavam cada vez mais longe dos meus ouvidos. Hoje, atipicamente, recebi a visita, honrosa, de uma, bem vinda, cigarra. Sempre tive a curiosidade, desde criança, de saber de onde partia este cantar quão estridente. O papai dizia que vinha do roçar das asas. Deu-me vontade de investigar, mas fiquei com receio de perturbá-la, e, assim, perder o espetáculo, daquela sinfonia, totalmente, rural. Um show bucólico, que traz a batuta do Criador.
Enquanto desfrutava da sua canção instigante, ia jogando água nas plantas. Começando pelas roseiras, depois, as trepadeiras, e por fim as frutíferas. Sempre à companhia do colorido flutuante nas asas das borboletas delirantes. O carambolo, parrudo e serelepe, bem deitado, no moro, sob a sombra do cajueiro, como faz toda manhã, enquanto faço minhas orações, espera para comer o resto da ração da Janis, que fica espalhado sobre a calçada. Cata grão por grão. O tempo todo desconfiado com os gatos. Vou ao varal para pegar as roupas sem perturbá-lo. De certa forma, já adquirir confiança. O segredo é não o fitar, mas, fazer de conta que não há ninguém por perto. Movimentos comedidos para não o assustar, nem comprometer a relação.
Ponho mais roupas na máquina para lavar, sabão, amaciante e alvejante. Ligo e saiu pela tangente… Termina de comer e sai em disparada. Sobe numa rapidez o muro, que daria inveja a qualquer alpinista. Já no topo e sem ameaças, olha pra mim, como se quisesse agradecer o rango, e bate duas vezes a cabecinha. Se soubesse que sou eu quem deveria agradecê-lo pela companhia, mas vamos deixa assim por agora. Importante é o contato que mantemos nas manhãs de setembro.
Ponho uma camiseta, velha, surrada e macia, e vou ao comércio comprar café, pão, leite, algumas laranjas ou uma Coca-Cola, bem gelada, contudo, é domingo, e encontro tudo fechado. Havia esquecido… Na volta, encontro uma quitandinha aberta e alguém comprando algumas mercadorias por uma portinhola. Consigo leite, pão, café e um pacote de bolacha Maria. Em casa, tiro a máscara, passo álcool nas mãos, nos braços e no rosto… Armo minha rede, na varanda, e vou ler a Bíblia (palavras de vida eterna), à companhia da Janis e do Juca, cadela e gato do Bento, que ficam deitados embaixo da rede e de frente pro ventilador. Assim, passamos horas a fio.
Antônio Ribeiro de Sampaio Neto, nascido no bairro Cidade Nova, em Teresina(PI), no dia 29 de junho de 1963. Filho de Singleustre Ribeiro de Sampaio e de Marlene Lemos de Sampaio. Ex-funcionário do Banco do Brasil onde ficou por 15(quinze) anos. Cursou Letras Português com Literatura Brasileira e Introdução à Literatura Portuguesa, na Ufpi (Universidade Federal do Piauí). Pai de Ananda Sampaio (Escritora), Raíssa Sampaio, João Victor Sampaio e Bento Sampaio. Atualmente, reside na cidade, ribeirinha, de União(PI). Tem por hobby música(fã incondicional de Belchior – in memorian), livros e cachaça, ao pé do balcão. Adora passar o tempo jogando conversa fora(cotidianas, bobas e triviais à companhia de mentirosos – pescadores e caçadores).