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quinta-feira, novembro 21, 2024
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O FRUTO PIQUI

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Coluna de Antônio neto

O “Piqui” foi criado numa família muito humilde, de cinco pessoas. O seu Joaquim, seu genitor, tinha a carroça por ofício. Logo cedinho, passava tocando seu burro a galope para ganhar o sustento suado e sagrado do pão de cada dia. Era um homem minúsculo, recatado, rústico, de pouca conversa e de poucos amigos. Introspectivo ao extremo. Moravam numa casinha de reboco, que ficava fincada numa quinta bucólica enorme, que fora dada para vigiar, cuidar e morar. Era quase um pomar, pois cultivavam caju, goiaba, banana, macaxeira, carambola, manga, tamarindo, mastruz, capim-de-cheiro, ata, mamão… à frente da casa tinha um pé-de-pião roxo para evitar mau olhado.

Fruto Pequi (Foto: Reprodução/UFG)

 O Pequi fazia pequenos favores para vizinhança. Como não havia supermercado à época, a maioria das compras eram feitas na feira do mercado público, e o que acabava, durante semana, comprava-se na quitanda da esquina. Na quitanda do Demétrio, o rolo de fumo ficava exposto sobre o balcão, que, por sinal, era muito cheiroso. Sempre, que a Cruzinha precisava de alguma compra, gritava-o, por cima da cerca de arame, para mandá-lo comprar alguma verdura, óleo, sabão, farinha, fósforo, corante, pimenta-do-reino, pílula-contra, sal, arroz, feijão… A maioria das compras vinha enrolada em papel embrulho, que ficava sobre o balcão, ao lado balança.

(foto: reprodução/Folha de S. Paulo)

Os quitandeiros tinham uma facilidade de enrolar as extremidades do papel e fazer uma embalagem, que era incrível. Geralmente, quando acabava o Continental do papai, era quem comprava. Sempre ficava com o troco. Era uma espécie de “office boy” tupiniquim do bairro. Ainda fazia capina, levava roupa para lavadeira, tirava goteira, fazia capina e caieira para vender o carvão. Às vezes, quando não havia nenhum recado e nenhum mandado, durante o período da manhã, saia de porta em porta, perguntando se não estava precisando de alguma coisa. “Seu Sampaio, tem alguma coisa, hoje, porque acabou o querosene da mamãe”.

O papai sempre dava a grana para comprar o combustível das lamparinas, mas, antes, mandava entrar, e dizia para Cruzinha botar almoço ou alguma merenda para ele. Ele sempre gostou de dar comida a quem tinha fome. Gostava de assistir o cabra derrubar um prato de cozidão com farinha, ou uma mão de vaca com pimenta, ou uma rabada, estupidamente, gordo, daquelas que é preciso abanar o caldo, pois a gordura fica apurada na superfície da panela. O Pequi era um bom garfo. O papai sentava com ele, à mesa, e ficava oferecendo os complementos. “Meu filho, você quer farinha, pimenta, suco, água, quer mais caldo?” Aceitava tudo, menos a pimenta. “Cruzinha, minha filha, bote mais carne, com tutano, mais arroz e feijão. Bote muito caldo!”.

Sempre, no final da tarde, a meninada ia assistir ao filme do Zorro, do Tarzan, do Batman… pois só havia televisão, lá em casa, e na casa do seu Oton. A sala ficava lotada de menino fedendo a macaco morto. Quando ele chegava, a primeira coisa que o papai perguntava: “Você já comeu, hoje, meu filho?”. O certo é que ele nunca saia, lá de casa, sem comer.



Antônio Ribeiro de Sampaio Neto, nascido no bairro Cidade Nova, em Teresina(PI), no dia 29 de junho de 1963. Filho de Singleustre Ribeiro de Sampaio e de Marlene Lemos de Sampaio. Ex-funcionário do Banco do Brasil onde ficou por 15(quinze) anos. Cursou Letras Português com Literatura Brasileira e Introdução à Literatura Portuguesa, na Ufpi (Universidade Federal do Piauí). Pai de Ananda Sampaio (Escritora), Raíssa Sampaio, João Victor Sampaio e Bento Sampaio. Atualmente, reside na cidade, ribeirinha, de União(PI). Tem por hobby música(fã incondicional de Belchior – in memorian), livros e cachaça, ao pé do balcão. Adora passar o tempo jogando conversa fora(cotidianas, bobas e triviais à companhia de mentirosos – pescadores e caçadores).

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